Fotos: Sérgio Vale
Há 39 dias, o senhor Josenildo foi expulso da própria terra. Viu o cercado de suas terras ser derrubado, perdeu o gado, a lavoura, a rotina que sustentava a família. Desde então, está morando de favor. Sem casa, sem renda, sem resposta. A única coisa que salvou no dia da operação foi a família — e móveis.
“É como se eu não tivesse RG, nem CPF. Só me sobrou a vida e o título de eleitor. Mas dá vontade de rasgar. Porque que adianta ter título se ninguém me representa?”, disse, em tom seco, o produtor rural em entrevista exclusiva ao Portal Correio OnLine.
Josenildo mora na zona rural de Xapuri e viu sua vida virar do avesso. Ele não foi sequer notificado com antecedência. Diz que tinha uma decisão judicial que lhe dava direito de permanecer na terra até decisão definitiva. “Mesmo com isso, chegaram lá e mandaram eu sair. Disseram que a decisão administrativa era soberana. E ponto. Saí humilhado, como um criminoso”, relata.
Abandono completo
Desde o dia da ação, nenhum representante do Estado procurou Josenildo. “Nem um telefonema. Ninguém apareceu. A gente tenta buscar ajuda, informação, e só ouve que não pode, que não tem como, que não tem o que fazer.”
O silêncio estatal se repete há 39 dias, enquanto isso o produtor está morando na casa de amigos. Vive com ajuda de conhecidos, sem saber o que será do amanhã. “Minha autoestima acabou. Fiquei três dias sem sair de casa, tonto, perdido, sem saber o que fazer. Só sei trabalhar na roça. Nunca fui empregado, nunca trabalhei na cidade. Agora, como é que eu sustento minha família?”, concluiu.
Entre o luto e a esperança
Apesar da dor, Josenildo ainda deposita fé na mobilização dos parlamentares. “Eu espero que essa audiência pública não seja só mais uma. Que saiam encaminhamentos, que tragam resultado. Que a gente possa ter notícia boa. Só isso que eu quero: uma notícia boa. Algo que possa mudar essa situação.”
Mas ele também é realista. A reconstrução da vida, segundo ele, será quase impossível. “Esperança de voltar eu tenho. Mas de reconstruir, de conseguir de novo o que eu tinha… isso é difícil. A vida na roça é dura. Tiraram tudo de mim.”
Um símbolo do descaso
A fala de Josenildo escancara uma ferida profunda: quando o Estado não reconhece a pessoa física, quando não protege o cidadão, ele também mata o sentido do eleitorado. O título de eleitor vira apenas um papel. Sem cidadania, sem proteção, sem amparo, o produtor rural se vê empurrado à margem, mesmo sendo parte da engrenagem econômica da Amazônia.
“Só me resta a vida. Mas se eu não sirvo como pessoa, não sirvo como eleitor. Vou cuidar da minha família, porque ninguém mais cuida. Nem o Estado.”
