A transferência do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) pegou de surpresa moradores do bairro Castelo Branco, em Rio Branco, e acendeu uma crise entre a gestão municipal e a comunidade da Baixada da Sobral. A mudança ocorreu durante a madrugada de quarta-feira, 21, por volta das 0h40, em meio a uma operação marcada por viaturas policiais, ausência de fardamento oficial e sem aviso prévio à vizinhança.
Vídeos registrados por moradores denunciam o que classificaram como uma ação “na calada da noite”, com intenção de evitar manifestações previamente organizadas. A revolta não tardou: moradores do Castelo Branco, Volta Seca e bairros adjacentes bloquearam vias e prometeram manter os protestos até que a prefeitura reavalie a decisão.
A movimentação é apenas a última etapa de uma polêmica que já havia começado dias antes, quando a Baixada da Sobral – inicialmente cotada para receber o centro – se mobilizou com protestos, ocupação da Câmara Municipal e apelos por diálogo. Mesmo diante dos apelos, a prefeitura oficializou a mudança por meio de publicação no Diário Oficial do Estado no dia 20, com valor de aluguel de R$ 6,2 mil mensais até maio de 2026. O endereço da nova sede, na Rua Bola Preta, não foi explicitado no contrato, mas já era alvo de resistência desde uma tentativa anterior de implantação.
Em coletiva de imprensa, o secretário municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, João Marcos Luz, afirmou que a mudança atende a uma decisão judicial respaldada pelo Ministério Público. Ele destacou que o imóvel funcionará apenas como ponto de recepção e orientação, sem oferta de pernoite ou alimentação, serviços que continuarão a ser prestados no Restaurante Popular.
“Vamos garantir dignidade com triagem, rodas de conversa e reencaminhamento familiar. Já temos 10 pessoas atendidas com critérios técnicos. E reforçaremos a segurança da região com câmeras e patrulhamento policial”, declarou o secretário.
A promessa, no entanto, não acalmou os ânimos. Representantes comunitários criticam a falta de diálogo e questionam a eficácia da medida sem planejamento coletivo. “A gente não está discriminando ninguém. Só queremos ser ouvidos. A prefeitura age como se fôssemos bandidos, mas tudo o que houve até agora foram manifestações pacíficas”, afirmou um morador da comissão da Baixada.
O presidente do bairro Volta Seca, Edmilson, foi direto: “Isso não é política pública, é imposição. O restaurante já é frequentado por muitos idosos. Colocar ali uma população vulnerável, sem estrutura, sem escuta, não vai funcionar”.
Segundo dados do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, o número de pessoas em situação de rua aumentou 25% no Brasil. Em Rio Branco, a estimativa é de 28 pessoas em situação de rua por 100 mil habitantes — a maioria entre 30 e 60 anos, com histórico de evasão escolar e vulnerabilidades sociais agravadas por desemprego, vícios e abandono.
No centro desse cenário, a sociedade se divide entre a urgência de políticas públicas efetivas e o direito à participação nas decisões que impactam diretamente a vida nos bairros. A crise do Centro POP ainda não terminou — e promete novos capítulos nos próximos dias.