EDITORIAL
A matemática é simples, mas as implicações estão longe de ser. O Estado do Acre prevê abrir mão de R$ 583,1 milhões em arrecadação em 2026, segundo o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias já enviado à Assembleia Legislativa. Um valor que se aproxima do orçamento de políticas inteiras — como saúde ou infraestrutura — e que cresceu 74% em relação ao cenário de apenas dois anos atrás.
Na teoria, trata-se de uma política pública clássica: usar incentivos para movimentar a economia, atrair investimentos e fortalecer cadeias produtivas locais. E há lógica nisso. Governos precisam fomentar a atividade privada — sobretudo em regiões onde o Estado ainda responde por boa parte da engrenagem econômica. O problema começa quando os números sobem, os discursos se repetem e o impacto concreto… ninguém consegue mensurar.
Não é a primeira vez que o governo Gladson Cameli aposta no instrumento da renúncia fiscal como âncora de política econômica. Mas a escalada nos valores levanta uma dúvida legítima: quem está ganhando com isso e qual o real retorno para o contribuinte? Em 2026, só o setor do comércio — leia-se varejo e reparação de veículos — será beneficiado com mais de R$ 312 milhões. É mais do que a maioria dos municípios acreanos dispõe em todo o ano para manter serviços básicos.
A isenção pode até ser estratégica, mas precisa ser transparente, monitorada e justificada com dados. Sem isso, o risco é o de sempre: abrir mão de arrecadação em nome de promessas vagas de desenvolvimento. Afinal, se a ideia é estimular empregos, inovação e arrecadação futura, seria razoável esperar uma prestação de contas pública: quantos empregos foram gerados? Qual o impacto na balança comercial do Estado? O que o Acre está colhendo com aquilo que deixou de cobrar?
O governo defende a medida. Aponta amparo legal, compromissos federativos, fala em ambiente de negócios e fortalecimento de cadeias produtivas. Mas o silêncio começa quando se pede análise técnica independente e indicadores de efetividade. Em tempos de orçamentos cada vez mais pressionados por demandas sociais e serviços colapsados, cada real não arrecadado precisa ser justificado — com planilha, não com discurso.
A pergunta, portanto, não é apenas quanto o Estado está deixando de arrecadar. Mas a quem está beneficiando, por quanto tempo, com qual propósito e sob que vigilância institucional. Porque, no fim das contas, incentivo sem resultado é privilégio. E privilégio sustentado com dinheiro público é um luxo que o Acre não pode mais se permitir.
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