Enquanto o Brasil avança no leilão de blocos de petróleo no litoral da Amazônia, especialistas, ambientalistas e comunidades tradicionais soam o alerta: o preço dessa decisão pode ser alto — e o Acre, mesmo longe do mar, está no centro dessa conta.
O leilão mais recente da Agência Nacional do Petróleo (ANP) ofertou 19 blocos de exploração na Margem Equatorial Brasileira, uma das regiões mais sensíveis e biodiversas do país, banhada pelo Rio Amazonas antes de encontrar o Atlântico. Dez blocos foram arrematados por um consórcio entre Petrobras e a gigante americana ExxonMobil. Os outros nove ficaram com a Chevron (EUA), em parceria com a estatal chinesa CNPC.
Essas multinacionais carregam um histórico controverso. A ExxonMobil enfrenta processos nos Estados Unidos por minimizar os riscos das mudanças climáticas e por campanhas enganosas sobre reciclagem de plásticos. A Chevron já foi condenada por contaminação ambiental na Amazônia equatoriana, além de ser alvo de diversas denúncias por violações ambientais ao redor do mundo. A CNPC, por sua vez, é acusada de operar com baixa transparência e desrespeitar normas internacionais de segurança em países em desenvolvimento.
Mesmo diante desse cenário, a Petrobras sustenta seu protagonismo na Margem Equatorial e defende o avanço da exploração. O Ibama, no entanto, já negou pedidos de licença ambiental devido à ausência de estudos robustos sobre os impactos à fauna marinha e aos ecossistemas costeiros.
O Acre na rota invisível dos impactos
A primeira vista, pode parecer que o Acre não tem nada a ver com a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Mas é exatamente o contrário. A crise climática, agravada pela queima de combustíveis fósseis, já está em curso no estado — com secas severas, enchentes destruidoras, rios cada vez mais instáveis e queimadas que tornam o ar irrespirável em algumas épocas do ano.
Além disso, os rios acreanos fazem parte do sistema hidrográfico interligado da Bacia Amazônica. Um desequilíbrio ambiental na foz pode desorganizar o ciclo das águas que sustenta a vida na floresta, impactando desde a biodiversidade até a produção agrícola e o abastecimento nas cidades.
Mas o impacto vai além da natureza. O Acre também sofre com o isolamento político. Enquanto multinacionais negociam diretamente com o governo federal, estados amazônicos como o Acre não são chamados para a mesa. Não há debate público, não há escuta. As decisões são tomadas longe — geograficamente e democraticamente.
E há um outro ponto sensível: os lucros do petróleo não pingam por aqui. Os bilhões movimentados nesse setor mal arranham a dura realidade de escolas improvisadas, postos de saúde abandonados, falta de saneamento e estradas que desaparecem na chuva.
“Se o governo federal quer mostrar ao mundo que se importa com a Amazônia, não pode abrir mão de ouvir os povos da floresta e os estados que compõem esse bioma”, afirma uma nota conjunta assinada por organizações ambientais da região Norte.
A Amazônia entre o petróleo e a sobrevivência
A Margem Equatorial Brasileira é hoje uma das maiores apostas do setor energético global. Mas essa corrida pelo petróleo na fronteira amazônica esbarra em dilemas éticos, ambientais e sociais profundos.
Trata-se de uma escolha de país: insistir em uma matriz fóssil em plena crise climática global ou investir em alternativas sustentáveis com justiça territorial. Para o Acre e outros estados da Amazônia, essa escolha não é técnica. É existencial.