Com colares feitos de sementes nativas, grafismos ancestrais, vestimentas bordadas à mão e muita presença feminina, a ativista Samela Sateré Mawé chegou a Londres para ocupar, com beleza, história e resistência, um dos espaços mais simbólicos da moda internacional. Ao lado da marca brasileira FIT, Samela apresenta a nova coleção da AMISM — Associação das Mulheres Indígenas Sateré Mawé dentro da exposição (re)Weaving Amazonia, que integra a London Climate Action Week.
Mais do que estética, o que se vê no Coal Drops Yard, em King’s Cross, é uma declaração política em forma de tecido, bordado e arte. Cada peça carrega o tempo, o território e a luta de um povo que, por séculos, resistiu à exploração e ao apagamento cultural. “Você veste parte da nossa ancestralidade. Tudo é feito a muitas mãos. Mãos que tecem, que criam, que ajudam. Waku”, diz Samela, em uma das legendas que acompanham os registros da exposição.
A presença das mulheres Sateré Mawé na London Climate Action Week carrega um simbolismo profundo. Num momento em que o mundo discute clima e futuro — com a COP30 se aproximando — é justamente o Brasil ancestral, invisibilizado e criador que ganha protagonismo internacional.
Uma coleção com raízes na floresta
A coleção FIT+AMISM nasce da coautoria entre a marca de moda e as mulheres do povo Sateré Mawé, reconhecidas por seu profundo conhecimento da floresta e por técnicas artesanais passadas de geração em geração.
Inspiradas nos grafismos tradicionais, nas sementes sagradas e nas tramas simbólicas da cultura Sateré Mawé, as peças incluem colares, roupas e objetos de decoração que carregam, além da beleza, memória, território e resistência viva.
Nas redes sociais, Samela compartilha os detalhes dessa criação coletiva: colares produzidos à mão, franjas cuidadosamente amarradas e tecidos que dialogam com o sagrado. “São essas mãos — que tecem, que criam e que ajudam — que tornam a coleção tão potente”, afirma. E reforça: 100% do lucro das vendas é revertido para a associação AMISM, fortalecendo a autonomia econômica das mulheres e provando que a moda pode, sim, ser ferramenta de transformação social.
Moda regenerativa e decolonial
A FIT, que há anos reposiciona sua atuação com base na sustentabilidade e no respeito às origens, mergulhou numa jornada de escuta e co-criação. A parceria com a AMISM, agora em seu segundo ano, representa uma virada na lógica do mercado: ao invés de apropriação, há colaboração, ao invés de tendência, ancestralidade.
As peças usam técnicas como tingimentos naturais, fibras amazônicas, sementes e grafismos inspirados nas luvas de tucandeira — tradicional símbolo de ritual e resistência do povo Sateré Mawé.
Vozes da Amazônia profunda na Europa
Durante a programação do evento, as mulheres da AMISM não apenas desfilaram ou expuseram produtos. Participaram de rodas de conversa, oficinas, encontros com lideranças internacionais e momentos de escuta mútua. Levaram ao coração de Londres o que muitos ainda não conhecem: a Amazônia viva, que cria, que pensa e que propõe outro modelo de mundo.
A coleção faz parte do projeto Costuras da Pedra, iniciativa que conecta marcas e comunidades tradicionais em práticas de moda mais justas, regenerativas e profundamente ligadas à terra.